Zelenski lembra a Lula que “a guerra não é no Brasil” e afasta concessões territoriais

Presidente ucraniano recusou proposta do homólogo brasileiro de que a Ucrânia deveria ceder a Crimeia para conseguir a paz com a Rússia.

Volodimir Zelenski lembrou hoje Lula da Silva que os ucranianos são vítimas da invasão russa e que “a guerra não é no Brasil”, afastando concessões territoriais e pedindo respeito pelos estados independentes.

“A guerra é em concreto na Ucrânia, as vítimas são concretamente os ucranianos. Não são os brasileiros, ou outros europeus, nem americanos. São concretamente dezenas de milhares de pessoas, centenas de milhares, que morreram ou ficaram feridas, são as nossas casas que foram atacadas ou bombardeadas, não as casas do Brasil ou de outros países”, afirmou Zelenski, numa passagem de uma entrevista à RTP, que será transmitida na íntegra hoje à noite.

Instado a comentar declarações de Lula na Silva, na semana passada na Cimeira dos BRICS, que “o Brasil não contempla fórmulas unilaterais para paz”, o líder ucraniano afirmou que, “para se dizer alguma coisa, é preciso perceber quem é a vítima e quem é o agressor”, acrescentando: “Não é uma forma unilateral, é uma fórmula do país que sofre com tudo isso, que sofre com a guerra e no território no qual a guerra se desenvolve. Ponto”.

Apesar de condenar a invasão da Rússia na Ucrânia, iniciada a 24 de fevereiro do ano passado, o presidente brasileiro já tinha admitido, em abril deste ano, a cedência da Crimeia, ilegalmente anexada por Moscovo em 2014, como uma saída para o conflito e, na cimeira dos BRICS, voltou a pedir uma paz negociada e o abandono de uma “mentalidade obsoleta da Guerra Fria”.

Em reação, Zelenski declarou que a Ucrânia é um país democrático e pretende envolver “o maior número de países possível” para a fórmula de paz de Kiev, que exige a retirada das forças russas da Ucrânia e rejeita qualquer concessão territorial. No entanto, disse estar aberto a propostas.

“Mas se as essas propostas se baseiam de alguma forma em cedência de alguma parte do nosso território, então isso não é coerente, primeiro, com os nossos pensamentos e, em segundo, certamente não é compatível com a nossa integridade territorial e soberania”, disse o líder ucraniano, insistindo que “as pessoas devem respeitar os territórios dos estados independentes”.

Em contraponto às críticas a Lula da Silva, na entrevista à RTP, Zelenski comentou em termos elogiosos a visita a Kiev na semana passada do homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa, que, numa cerimónia no dia do 32.º aniversário da independência da Ucrânia, assinalada a 24 de agosto, fez uma curta intervenção em ucraniano.

O gesto não apanhou o presidente ucraniano de surpresa, que afirmou tê-lo apreciado, apesar de “algum sotaque”, mas denotou “respeito pela Ucrânia”.

Zelenski considera Marcelo Rebelo de Sousa “uma pessoa com muito carisma”, que sente a voz do seu povo e também do povo ucraniano, e que os dois líderes estão “em uníssono, tal como dizem os músicos” e desta forma conseguirão tudo.