Resolvi, por causa de um sinal suspeito e depois de muita resistência, consultar um dermatologista. Entendam-me: para mim, ir a um dermatologista pela primeira vez é uma situação incómoda. Imagino uma sala de espera cheia de metrossexuais e peruas botocadas e eu sou muito old-school para essas modernices. Mas acabei por ir, depois de muita luta e pressionado pela senhora minha mulher, aquela a quem obedeço. Sou um homem já veterano no casamento e sei da inutilidade de tentar contrariá-la, mas, em memória do jovem rebelde que um dia fui, ainda tento mostrar uma réstia de vontade própria (exercício que rapidamente se revela fadado ao fracasso).

Munido de enorme coragem, lá me pus a caminho do hospital para a consulta. Senti algum consolo quando, procurando o serviço de dermatologia, passei pelo de urologia e pensei que, afinal, uma ida ao dermatologista não era assim tão mau.

Chegado ao meu destino fiquei mais descansado, pois o excelente Hospital da Luz tem umas maquinetas que fazem o check-in para a consulta e permitem o pagamento da mesma. Evitei assim a situação potencialmente embaraçosa de ter de me dirigir ao balcão e dizer, em voz não muito alta, o meu nome e a razão de ali estar.

Aguardei do lado de fora da sala de espera, a uma distância que me pareceu segura e que me permitia estar atento ao ecrã que chamava para as consultas. Tudo descambou quando, pelos vistos, não reparei que o meu número já estava no ecrã de chamada, o que obrigou a recepcionista a gritar o meu nome em voz alta. O meu pior pesadelo tinha acabado de se realizar. Todos na sala de espera da dermatologia olharam para mim lá fora e agora até sabiam o meu nome. Mesmo os da oncologia, na sala vizinha, esticaram o pescoço para terem a certeza de que me viam.

Passei ligeirinho para o corredor das consultas e lá fui, ruborizado, conhecer o meu médico.

O grau de ansiedade baixou ligeiramente, dado que o dermatologista era de uma extrema simpatia e parecia achar normal que um homem à antiga como eu ali estivesse.

Começou por querer saber do sinal e fez a pergunta clássica das primeiras consultas: “Já houve casos na sua família de sinais desses que fossem malignos?”

Perante esta pergunta, fiquei sem resposta. Expliquei ao senhor doutor que na minha família ninguém comenta questões de saúde pessoal. A saúde de cada um é um assunto com o qual não devemos maçar as outras pessoas. Podemos discutir se alguma maleita de um grande líder do passado influenciou a política mundial, podemos, en passant, referir que um tio afastado morreu, mas sem entrar em pormenores médicos. Sempre senti que inquirir sobre a saúde alheia era uma intromissão na intimidade de cada um. Como explicar isto ao médico? Muitas vezes sinto que vivo noutra época relativamente a essa questão.

Também pergunto aos meus amigos se está tudo bem, mas a pergunta é circunstancial. Na verdade, não espero nenhuma resposta concreta. Aflige-me quando em resposta começam a descrever-me as suas maleitas. Faço sempre um ar interessado, pois acho que é nessas situações complicadas que se revela a educação de cada um. Aprendemos a ser estóicos para conseguirmos ultrapassar estes momentos embaraçosos.

Recordo-me de uma vez ter ficado emocionado interiormente perante a sucessão de doenças que um amigo me descrevia. Espero não ter revelado o que sentia, pois a pior coisa que alguém se pode permitir numa situação dessas é ficar sentimental e expressar uma emoção. Tenho alguns amigos que começaram a expressar emoções e nunca mais foram os mesmos.