Num mundo em que o cinismo é elogiado, crer numa ideologia não é uma qualidade muito apreciada pela populaça.

Nunca fui membro do partido Iniciativa Liberal. Sigo a máxima grouchiana-marxista de que não posso ser membro de um partido que me aceita como membro. Por isso assisto ao actual momento de eleições internas como um outsider. Também não escondo que votei liberal nas duas últimas legislativas e que poucos partidos me deram tanta esperança na mudança possível. Sigo, pois, com acrescido interesse a disputa interna. Uma coisa que sempre me fascinou neste partido é que os seus membros iniciais acreditavam em ideologias. Num mundo em que o cinismo é elogiado, crer numa ideologia não é uma qualidade muito apreciada pela populaça.

Conforme referiu Carlos Guimarães Pinto, é um partido que caminha nos ombros de ilustres pensadores. Mas ser inspirado por muitos pensadores não deve condicionar a sua acção. Muita ideologia acaba por ser contraproducente. Acabam todos a disputar o campeonato da pureza ideológica e isso não interessa a ninguém. Tirando o PCP, não há mais nenhum partido com esta carga ideológica.

O Bloco é um partido populista, o Chega da esquerda. Diz uma coisa hoje e o seu contrário amanhã. Conseguiram o pleno de apoiar um governo, votar os respectivos Orçamentos e, ao mesmo tempo, cá fora, continuarem com um discurso de oposição. O Bloco tem a vantagem de ninguém lhes cobrar coerência e, por isso, lá continua alegremente a mandar postas de pescada sobre qualquer assunto.

Os socialistas costumavam ser um partido ideológico, mas rapidamente se aperceberam de que ideologias e o domínio do aparelho estatal não combinam. O socialismo foi metido na gaveta e lá continua. Já ninguém se lembra em que gaveta ficou.

Os sociais-democratas são, por natureza, avessos a ideologias. Talvez se tenham preocupado com isso no início, quando ainda defendiam o socialismo como solução, mas deixaram esse tipo de preocupações e dedicaram-se a ser um partido de fazedores. Com Cavaco Silva, as discussões ideológicas também foram colocadas numa gaveta e a definição de social-democracia nunca foi assunto que o preocupasse.

Sobra o CDS, que nunca foi um partido de ideologia mas de ideologias. Entre a doutrina social da Igreja, o conservadorismo, o liberalismo e o populismo, os centristas nunca chegaram a uma conclusão sobre o seu posicionamento.

Sobre o Chega não há muito a dizer. É um partido unipessoal que não tem substância nem profundidade. Basta ler o seu programa eleitoral inicial, em que defende soluções liberais para a economia e, depois, acaba a defender a nacionalização da TAP. O Chega não tem ideologia pois nasceu para ser um partido agregador dos descontentes em vez de ser um partido que junta os defensores de uma causa comum. É do contra e ponto final. É o partido dos comentadores de tasca, que nunca sabem muito sobre qualquer assunto mas têm soluções para tudo.

Sobra então a Iniciativa Liberal neste momento histórico de mudança. É a primeira eleição sob os holofotes da comunicação social e isso pode provocar mossas na percepção que o público tem deste partido. Com a liderança de Cotrim Figueiredo, o partido cresceu e ganhou respeitabilidade, complementada por uma certa irreverência na comunicação. Foi um excelente líder e que muito tinha ainda para dar.

Sobre os presentes candidatos, poucas opiniões tenho a dar. Não é a minha disputa, sou apenas um outsider. Mas o que representa a Iniciativa Liberal para muitos dos seus eleitores é uma questão que me preocupa. É claro que o partido precisa de crescer para novos públicos mas, ao mesmo tempo, é necessário resistir ao populismo. Os actuais eleitores são pessoas que se sentiram atraídas por um posicionamento distintivo, contrastante com alguns partidos que estavam cristalizados no tempo e que continuam a defender soluções com provas dadas de mau funcionamento.

A Iniciativa inova ao fugir do consenso do sistema que nos dita que este país não tem remédio e que temos de nos adaptar e aceitar a mediocridade. Fugir do consenso de que só o Estado soluciona tudo, quando já todos perceberam que o Estado soluciona cada vez menos. A Iniciativa não precisa de guerras ideológicas. A Iniciativa precisa de continuar a desmentir as falsas verdades e tabus que nos são impostos pelas décadas de governos socialistas.

A Iniciativa precisa de continuar a ser o partido das soluções práticas, inovadoras e de eficácia comprovada noutros países. Menos discursos e mais acção. Menos areia para os olhos dos contribuintes e maior prestação de contas. Menos medíocres que não acreditam no valor dos portugueses e mais janelas de oportunidade para todos poderem criar e crescer, sem deixar ninguém para trás, pois o futuro será o conjunto da participação de todos.

Não precisamos de uma Iniciativa Liberal nova, precisamos é de mais Iniciativa Liberal.