Olhando à volta, concluo que o mundo está cada vez mais chato. Já nem me refiro à guerra ou à pandemia, refiro-me às pessoas. O mundo está chato porque as pessoas estão cada vez mais maldispostas e raivosas.
Tudo é razão para discussões e as opiniões estão cada vez mais extremadas. A grande maioria simplesmente não dá opiniões em público, com medo de ofender. São tantas as possibilidades de alguém ficar ofendido por qualquer coisa que cada vez mais temos de pensar várias vezes antes de fazer um comentário. Um mundo chato, comandado por chatos hipersensíveis.
Ainda recentemente falava com um jovem que me dizia que não fazia humor com o tema sexo. A questão não era que o sexo pudesse ofender alguém mas, segundo ele, o tema sexo não era a preocupação principal da sua geração. Acabámos a partilhar receitas com quinoa e a trocar ideias de fitness. Foi a minha tentativa de me integrar nessa nova geração de pussies chatos mas muito saudáveis.
Imagino que essa gente não possa ser assim tão bem-comportada. É deprimente pensar que vamos deixar o mundo aos totós. Deve haver alguma explicação que nos escapa. Desconfio que há um mundo paralelo onde essa geração solta a franga. Como eles cresceram numa atmosfera em que não podem dizer nada nem fazer nada de divertido, com medo do politicamente correcto, estou em crer que o que nós, mais velhos, vemos não é a realidade. Esses jovens aprenderam a responder e a comportar-se da maneira correcta, mas no mundo secreto deles deve haver rambóia da grande, piadas inconvenientes e cambalhotas à fartazana. Durante muito tempo criticávamos os jovens por exporem as suas vidas nas redes sociais, mas, na verdade, só estávamos a ver a realidade que eles queriam que víssemos. A verdadeira realidade estava a ser-nos escondida. São espertos estes miúdos. Aparentam ser uns totós, mas são uns arrebentas do piorio.
Na minha juventude fazíamos tudo às claras. Nisso, éramos um bocado toscos. Caíamos para o lado após uma bela noitada de copos, mas só alguns amigos viam essa triste situação, pois, na altura, não havia redes sociais nem telemóveis capazes de fotografar as nossas tristes figuras. Só de pensar nalgumas roupas que se usavam fico grato de não haver muitas fotografias com essas tristes memórias. Nem vou mencionar os penteados de então. Eu era mais rocker (cabelo comprido), mas tive alguns amigos mais à la mode, com penteados neo-românticos que, se Deus quiser e o bom gosto impedir, nunca mais voltam a estar na moda.
O mundo muda e à medida que envelhecemos vamos achando que as novas gerações não sabem fazer nada. Nem imagino o que a geração do meu pai pensava sobre a minha. Mas há aqui uma ilusão que o tempo cria. A natureza é sábia e vai-nos apagando algumas lembranças menos felizes do nosso passado, sobrando apenas as boas memórias. Sobra-nos a ilusão de um tempo idílico que, na verdade, não corresponde à realidade. Ao ouvir pessoas da minha idade falarem das suas juventudes, nunca ouço falar das angústias e dificuldades que vivemos. A vida nesse tempo não era fácil e muitos ficaram pelo caminho, devido a erros juvenis. Havia menos dinheiro e menos possibilidades. A juventude acabava mais cedo e muitos já estavam casados com pouco mais de 20 anos. Com pouco mais de 25 anos já devíamos estar bem encaminhados, com profissões para a vida e filhos. E tudo isto sem recorrer à quinoa.
Não existe o meu tempo nem o vosso tempo. Só há “o tempo”. Quem vive preso no passado não descobre o presente. Aprendemos muito com os mais antigos mas, se tivermos mente aberta, também aprendemos muito com os mais novos. O mundo não pára e não nos cabe parar antes do nosso tempo.