Não foi uma semana fácil para os seguidores dos partidos de extrema-esquerda. O mais ideológico, o PCP, manteve-se igual a si próprio e só surpreendeu quem esteve em coma mental nos últimos anos. Já o Bloco de Esquerda, como evita falar de ideologia para não se comprometer, fez uma jogada de marketing e reposicionou-se. Os bloquistas ficam ofendidos quando lhes perguntamos pela coerência. O Bloco é um produto de marketing, criado quando o PSR e a UDP perceberam que não iam a lado nenhum sem uma imagem nova e mais atraente. Esconderam a ideologia marxista/trotskista, vestiram um fato moderninho e vai de enganar inocentes.
É difícil compreender quem ainda acredita em teorias marxistas no século XXI. Percebo que nos anos 50 do século passado ainda fosse possível acreditar no comunismo. Era uma época em que se começava a conhecer as barbaridades de Estaline, mas ainda era possível desconfiar das fontes. No entanto, em 1956, com a invasão da Hungria e a onda de repressões que se seguiram, qualquer defensor da liberdade devia ter perdido as ilusões. E depois disso foram inúmeros os casos de demonstração de totalitarismo, que deveriam ter obrigado muitos a renunciar ao apoio ao Partido Comunista. Esta verdade, que o PCP nunca defendeu a democracia, era tão evidente já nessa época que, passados estes anos todos, nada justifica qualquer ilusão quanto à natureza desse partido. Nos anos 70, 80 e 90, os comunistas continuaram a apregoar uma superioridade moral difícil de justificar vinda de quem andou décadas a defender a opressão de povos de Leste, que buscavam a liberdade da tirania comunista.
Um jovem, nos anos 50, pode ter sido atraído pela luta contra as injustiças sociais da época e pelo ideal do internacionalismo comunista. Pode ter evitado as notícias que denunciavam os gulagues e as terríveis condições de quem vivia no “socialismo real”. Mas como defender e acreditar na retórica e ignorar os milhões de mortos do estalinismo? Muitos simplesmente não podiam renunciar publicamente ao comunismo. Muitos artistas, escritores e outros intelectuais sabiam que seriam ostracizados caso não alinhassem pelo pensamento comunista. Venderam a consciência em troca do apoio do sistema do qual eles próprios faziam parte e eram guardiões.
O comunismo tornou-se uma seita da qual não se podia sair. Cabia aos membros só se darem entre si e só consumirem livros e filmes aprovados pelos mestres. Como seita que eram, defendiam-se em grupo contra qualquer ataque exterior. Qualquer membro que pusesse em questão alguma verdade absoluta era imediatamente posto de lado e sujeito a teste de fé. Um comunista tem muito em comum com uma testemunha de Jeová. São as “testemunhas de Lenine”.
O comunismo é uma religião com os seus livros sagrados, os seus profetas e guardiões do templo, que garantem a pureza da mensagem. Tal como numa religião, não é possível tentar ter discussões lógicas com os seus seguidores. Uma pessoa crente não consegue explicar muitas das coisas em que acredita a um não crente. Um comunista também continua a acreditar em “verdades” que, quando foram postas em prática, nunca funcionaram. Mas essa evidência não lhe abala a fé. Negar essa fé seria reconhecer que tudo o que defendeu durante anos não faz sentido. Por isso, o único caminho é a fuga para a frente.
Nos últimos anos, na Europa e nos Estados Unidos tem havido um certo deslumbramento com o socialismo. A cultura woke tem ganhado muitos seguidores e uma nova geração de visionários concluiu que o “verdadeiro socialismo” nunca foi implementado. Para estes iluminados e ignorantes da História, só o marxismo irá retirar as pessoas da miséria. A verdade é que não há um só exemplo de sociedade que tenha tentado o comunismo e não tenha acabado em horrores totalitários, mas isso não importa ao verdadeiro crente.