No final dos anos 50, a carreira de Frank Sinatra parecia ter acabado. Havia cantores mais jovens, o Rock & Roll dominava as tabelas e, mesmo como actor, os estúdios não queriam mais saber dele.
Numa entrevista, Sinatra conta que, nas festas de Hollywood, as pessoas olhavam para o chão para não terem de o encarar. As mesmas pessoas que ele considerava serem suas amigas, agora, viravam-lhe a cara. Sinatra compreendeu que essas pessoas não eram amigas, eram pessoas com quem ele fazia negócios e que agora achavam que não tinham mais nada a ganhar com ele, e, portanto, evitavam-no. É a solidão de quem tem sucesso. No alto da montanha não há mais ninguém e o ar é rarefeito.
A carreira de Sinatra voltou a brilhar depois, e esses “amigos” voltaram a ser “amigos”, mas Sinatra nunca mais se esqueceu de que quem te aplaude e elogia hoje será o primeiro a cuspir em ti quando tropeçares.
No cume da montanha por onde anda Ronaldo, a solidão é ainda maior. Sinatra não tinha as televisões e os jornalistas a filmá-lo 24 horas por dia. Sinatra podia esconder-se, Ronaldo só se pode esconder dentro de si. Ele é o velho actor que ganhou todos os Óscares, mas que tem dificuldades em encontrar um papel no qual possa voltar a brilhar.
O público continua a gritar o seu nome, mas o velho actor sabe que é mais por simpatia do que por admiração. São aplausos ao seu passado, ao homem que tudo ganhou, quando o que o velho actor queria era que aplaudissem a sua arte presente. É o drama do velho criativo a quem todos querem ouvir falar de passadas glórias. Ninguém quer falar do passado quando acha que ainda tem presente.
Os críticos falam em coro na necessidade de saber retirar-se, mas o actor sabe que ainda tem uma última grande representação para fazer. Voltar a ouvir aplauso pelo que acabou de fazer. O sucesso é uma droga cuja falta provoca ressaca, que se tenta adiar o mais possível.
Ninguém chega ao nível de Ronaldo sem ser egoísta, egocêntrico e obsessivo. São essas as características que o fizeram superar todos os obstáculos, que lhe deram a glória que todos aplaudiram. Ser “um gajo porreiro” nunca foi a sua ambição. É uma vida focada num objectivo. São essas mesmas características que, agora, todos criticam.
Não é realista esperar que haja um momento transformador e que este deus desça do Olimpo. Fomos todos cúmplices enquanto o aplaudíamos e venerávamos, fomos cúmplices quando exigimos que ele fosse um super-herói. Agora ficamos surpreendidos por ele lutar para tentar continuar a ser o que sempre lhe pedimos que fosse. Queríamos um super-herói e agora custa-nos reconhecer a sua humanidade.
Da minha parte, não quero um Ronaldo humilde ou mais humano. Quero o Ronaldo de outro planeta, homem épico que nos faz sonhar e admirar. Esse Ronaldo não pede desculpas por ser como é. Se fosse diferente, não era o Ronaldo. Se fosse mais humano, não era um super-herói. Não era o Ronaldo.
Que venha essa última representação dramática e épica que ele ainda tem dentro de si. Haverá novamente aplausos por glórias presentes. O que estamos a ver é uma narrativa de um filme em que o herói está na mó de baixo, a levar pancada dos vilões, mas que vai reerguer-se e ultrapassar o mau momento.
O filme Ronaldo terá um grande final. E espero que seja com música do “Old Blue Eyes”: “And not the words of one who kneels/ The record shows I took the blows/ And did it my way”.