Vi os deputados do Bloco a aplaudirem o discurso de Zelenski no nosso Parlamento. Não só aplaudiram como fizeram questão de aplaudir de pé um discurso em que o Presidente ucraniano pedia mais armas e mais NATO. Nem consigo imaginar a dor que vai na alma dos bloquistas. Ter de aplaudir a NATO, a guerra e ainda fazer sorrisos para as câmaras deveria dar direito a uma caixa inteira de Kompensan e a várias consultas no endireita, para tratar da coluna vertebral.
Mas, como eu próprio sou um homem indulgente, consigo compreender essa tomada de posição. Conforme diz o nosso estimado primeiro-ministro, “vamos lá ver”. Aparentemente, a posição de qualquer esquerdista depende de um só parâmetro: qual a posição dos imperialistas americanos nesta questão? Seja qual for essa posição, o bom povo de esquerda está contra. É fácil. No caso da Ucrânia, este parâmetro definidor complicou-se. A mana Mortágua ainda se atrapalhou e, nos primeiros dias, andou num ziguezague de justificações para não tomar uma posição evidente nesta matéria. Já a camarada Martins remeteu-se ao silêncio, para perceber para onde tendia a opinião pública e ajustar o seu discurso em conformidade.
O dilema esquerdista na questão ucraniana não é de fácil resolução. Por um lado, Putin não é propriamente o representante dos “amanhãs que cantam”. Por outro, apoiar Zelenski é apoiar um regime que sonha com a NATO e a União Europeia. Se fugir, o bicho pega; se ficar, o bicho come. O Bloco sempre conseguiu passar pelos pingos da chuva nos seus alinhamentos internacionais. Oficialmente, não tem nenhum modelo em nenhum país que lhe sirva de referência ou inspiração. É uma posição sensata, pois permite criticar tudo e todos e, ao mesmo tempo, estar a salvo de críticas, uma vez que ninguém conhece o seu posicionamento. Ter um posicionamento significa ser coerente, mas, quando se pede coerência a um bloquista, eles ficam ofendidos. Nisso, os comunistas são mais corajosos e conseguem defender países cujos regimes são autênticas ditaduras dormindo bem com isso. Há quem considere esta coerência uma virtude.
No fundo, o Bloco também se inspira nesses regimes, mas tem medo de perder votos e vai mudando de opinião conforme a direcção do vento. Ao Bloco interessa propagandear três ou quatro fábulas infantis e isso é o suficiente para encantar os seus seguidores: a fábula de que o Estado tem dinheiro infinito para distribuir; a fábula de que os patrões são todos uns vampiros; a fábula de que a sociedade evolui quanto mais divisões tiver; a fábula de que basta darmos as mãos e cantar o “Kumbaya” para que o mundo melhore. Um esquerdista evita sempre pensar nas consequências das suas propostas. Basta o ponto de vista emocional para definir as suas posições. E, caso o seu interlocutor tenha uma opinião diferente, faz uma birra e insulta-o, o que, normalmente, acaba por fazer com que ele se cale. Qualquer discussão pode rapidamente passar à acusação de fascista, poupando assim o esquerdista a ter de justificar as suas ideias. No final, fica com a ideia de que venceu a discussão quando, na verdade, foi o seu interlocutor que entendeu que não precisava de perder tempo com discussões infantis e foi-se embora. Para um esquerdista, o Estado é o substituto do pai. Deve proibir, deve sustentar e deve dar-nos tudo, do berço até à cova. Está na sua natureza negar a realidade e criar um mundo imaginário onde tudo será de acordo com as suas ideias. São estas as bases de qualquer sistema totalitário, mas esta é mais uma realidade que um esquerdista faz questão de negar. O esquerdista é uma consequência da incapacidade de passar do mundo irreal da adolescência para a realidade da idade adulta. No mundo actual das redes sociais ganha quem berra mais alto e quem insulta mais facilmente. Esta realidade extermina cada vez mais o discurso e bloqueia o diálogo. Não quer dizer que vença a discussão, significa simplesmente que as pessoas adultas deixam de ter paciência para aturar imaturos birrentos.